APETITE
Como isto
framboesas silvestres vermelhas
ainda quentes do sol
e cheirando vagamente a não-me-toques
na lembrança de meu pai
envolvendo o guardanapo
abaixo do queixo e inclinando-se
sobre uma tijela de ferro
de brilhante drupéola
a flutuar de creme
meu pai
com o suspiro de um homem
que viu tudo e foi redimido
disse repetidas vezes
enquanto erguia sua colher
os homens matam por isso.
Tradução de Dalcin Lima aos 20 de dezembro de 2016.
APPETITE
I eat these
wild red raspberries
still warm from the sun
and smelling faintly of jewelweed
in memory of my father
tucking the napkin
under his chin and bending
over an ironstone bowl
of the bright drupelets
awash in cream
my father
with the sigh of a man
who has seen all and been redeemed
said time after time
as he lifted his spoon
men kill for this.
APPETITE. In: The writer’s almanac. Disponível em:< http://writersalmanac.publicradio.org/index.php?date=2002/05/11>. Acesso em: 20. Dez. 2016.
SOMOS
Amor, somos um pequeno tanque.
Em nós, sapos amarelos tomam sol.
Suas pernas penduradas. Suas coxas se abrem
como as pernas de um recém-nascido.
Sobre nossa pele, baratas d’água insinuam incisões
mas não deixam marcas de seus traços.
Tocar é assim. E o que tocar desperta.
Aqui mesmo as mais negras bagas engordam
sobre o tanque de nosso ser.
É um mês fértil para elinar ervas daninhas.
Elas se sobressaem como as mandíbulas dos reis de Habsburgo.
Amanhã gotejarão seu sangue
assim como o algodoeiro rompe seu algodão
deixando espinhos secos e sementes fechadas.
Entretanto mesmo sabendo
que o tempo desce para fechar as portas ― obstinado, justo, marcando os ossos
com gelo e algo mais ―
pulamos, nos tornamos maiores. O banco de areia
é, todavia, tópico. Mesmo sabendo
que um de nós pode alcançar a si mesmo
estamos preparando uma partida
para isso. Amor, estamos preparando uma partida.
Tradução do original inglês por Dalcin Lima, aos 19 de dezembro de 2016, baseada na versão espanhola postada no blog Petit Palais du Vocabulaire (não há indicação do nome da tradutora ou tradutor). In: Petit Palais du Vocabulaire. Disponível em:< http://petitpalaisduvocabulaire.blogspot.com.br/search/label/*Siete%20poetas%20norteamericanas%20actuales>. Acesso em: 21. Ago. 2016.
WE ARE
Love, we are a small pond.
In us yellow frogs take the sun.
Their legs hang down. Their thighs open
like the legs of the littlest children.
On our skin waterbugs suggest incision
but leave no marks of their strokes.
Touching is like that. And what touch evokes.
Just here the blackest berries fatten
over the pond of our being.
It is a rich month for putting up weeds.
They jut like the jaws of Hapsburg kings.
Tomorrow they will drop their blood
as the milkweed bursts its cotton
leaving dry thorns and tight seeds.
Meanwhile even knowing
that time comes down to shut the door
– headstrong, righteous, time hard at the bone
with ice and one thing more –
we teem, we overgrow. The shelf
is tropic still. Even knowing
that none of us can catch up with himself
we are making a run
for it. Love, we are making a run.
WE ARE. In: The Chatterbox. Disponível em:< http://cacchieressa.tumblr.com/post/4662800280/we-are-by-maxine-kumin>. Acesso em: 08. Ago. 2016.
COMO É*
Devo dizer como é estar em suas roupas?
Um mês após sua morte usei seu casaco azul.
O cachorro no centro da minha vida reconhece
você veio me visitar, ele fica em êxtase.
No bolso esquerdo, um buraco.
No direito, um tíquete de estacionamento
entregue em agosto passado na Bay State Road.
Em meu coração, uma dispersão de asclépias,
uma eclosão dos casulos da alma.
Minha pele pressiona seus antigos contornos.
É quente e seco por dentro.
Penso no último dia de sua vida,
velha amiga, como eu iria desfazê-lo,
juntá-lo outra vez em uma diferente colagem,
de volta do carro da morte parado na garagem,
subindo as escadas, suas mãos descruzadas,
remontando pedaços de pão e atum
em uma cerimônia do sanduíche,
recuando o filme caseiro até um espaço
nosso e tranquilo, uma lugar na cozinha
com vodca e gelo, nossas palavras em carne viva.
Amiga querida, você inspirou multidões
com o seu exemplo. Elas incham
como sacos de vinho, esgarçando suas costuras.
Eu ficarei anos reunindo nossas palavras,
pescando nossas cartas, fotos e manchas,
firmando minhas costelas neste tecido indelével
para vestir o mudo manto azul de sua morte.
Tradução de Maira Parula. In: poemas cubas e torneiras. Disponível em:< http://naofeche.blogspot.com.br/2014/03/maxine-kumin.html >. Acesso em: 05. Ago. 2016
* "How It Is", ou na tradução Como É, poema de Maxine Kumin dedicado a Anne Sexton logo após sua morte em 4 de outubro de 1974, dia em que as duas amigas almoçaram juntas e Kumin ajudou Sexton a revisar seu manuscrito de The Awful Rowing Toward God. Ao voltar para casa, Sexton se matou. A poeta Maxine Kumin faleceu em 6 de fevereiro de 2014. Nota de Maira Parula.
HOW IT IS
Shall I say how it is in your clothes?
A month after your death I wear your blue jacket.
The dog at the center of my life recognizes
you’ve come to visit, he’s ecstatic.
In the left pocket, a hole.
In the right, a parking ticket
delivered up last August on Bay State Road.
In my heart, a scatter like milkweed,
a flinging from the pods of the soul.
My skin presses your old outline.
It is hot and dry inside.
I think of the last day of your life,
old friend, how I would unwind it, paste
it together in a different collage,
back from the death car idling in the garage,
back up the stairs, your praying hands unlaced,
reassembling the bits of bread and tuna fish
into a ceremony of sandwich,
running the home movie backward to a space
we could be easy in, a kitchen place
with vodka and ice, our words like living meat.
Dear friend, you have excited crowds
with your example. They swell
like wine bags, straining at your seams.
I will be years gathering up our words,
fishing out letters, snapshots, stains,
leaning my ribs against this durable cloth
to put on the dumb blue blazer of your death.
HOW IT IS. In: A poem for every day. Disponível em:< http://emilyspoetryblog.com/2013/09/29/how-it-is-by-maxine-kumin/ >. Acesso em: 05. Ago. 2016.
NADO MATINAL
Na minha cabeça vazia surge
uma praia de algodão, um embarcadouro de onde
Eu me exibi, oleosa e nua
em meio a cerração, friorenta solidão.
Não havia horizonte, nem teto nem solo
para contar a água que cai do céu.
A névoa noturna pesada como um tecido grosso
me encerrou em seu felpudo crescimento.
Pendurei meu roupão em dois pinos.
Agarrei o lago entre minhas pernas.
Invadida e invasora, eu
fui dando braçadas sob aquele céu plano.
Peixes contraíram-se abaixo de mim, depressa e dócil.
Em sua zona verde, eles entoaram meu nome
e no ritmo do nado
balbuciei um vagaroso hino de dois quartos de compasso.
Balbuciei "Fique Comigo." Uma rosa
achatada na delicada pisada dos meus pés,
rosa nas bolhas que eu pus para fora
obliquamente, rastejando por minha boca.
Meus ossos absorveram água; a água desabou
por minhas entradas. Eu era o poço
que alimentava o lago que encontrou meu mar
no qual que cantei "Fique Comigo."
Tradução de Dalcin Lima aos 15 de dezembro de 2016.
MORNING SWIM
Into my empty head there come
a cotton beach, a dock wherefrom
I set out, oily and nude
through mist, in chilly solitude.
There was no line, no roof or floor
to tell the water from the air.
Night fog thick as terry cloth
closed me in its fuzzy growth.
I hung my bathrobe on two pegs.
I took the lake between my legs.
Invaded and invader, I
went overhand on that flat sky.
Fish twitched beneath me, quick and tame.
In their green zone they sang my name
and in the rhythm of the swim
I hummed a two-four-time slow hymn.
I hummed "Abide With Me." The beat
rose in the fine thrash of my feet,
rose in the bubbles I put out
slantwise, trailing through my mouth.
My bones drank water; water fell
through all my doors. I was the well
that fed the lake that met my sea
in which I sang "Abide With Me."
MORNING SWIM. In: Library of Congress. Disponível em:< https://www.loc.gov/poetry/180/137.html>. Acesso em: 08. Ago. 2016.
INDO À JERUSALÉM
Enfeitado com escapulário,
figurão com enormes cruzes
e clamando lá fora,
Morte ao Infiel!
os Francos varridos pelas ondas
cavalgando seus cavalos de pedra,
corpulentos garanhões
considerados vistosos demais para a batalha,
apenas para conhecer os turcos
morenos, pequenos, bigodudos
agachados agilmente defronte
suas delgadas éguas árabes,
o único gênero que eles
achavam conveniente para o combate rigoroso,
e assim as pedras do Reno,
movendo-se furiosamente entre
as pequenas éguas de cara redonda,
as éguas pescoço de cisnes de calda altas
reproduzindo conforme elas partiam,
mergulhadas na Cruzada inteira
no front Oriental
dentro da caótica beatitude.
Anjos das ruas de ouro
benignamente consideravam isso,
prodígios de Deus a se observar.
Ambos os lados permaneceram desmontados
enquanto a Natureza seguiu seu curso.
Tradução de Dalcin Lima aos 14 de dezembro de 2016.
GOING TO JERUSALEM
Bedecked with scapulars,
heavy with huge crosses
and crying out abroad,
Death to the Infidel!
the Franks swept by in waves
riding their stone horses,
big-barreled stallions
deemed brave enough for battle,
only to meet the swart,
small, mustachioed Turks
crouched nimbly athwart
their slight Arabian mares,
the only gender they
thought fit for close combat,
and thus the Rhenish stones,
running amok among
the little dish-faced mares,
the high-tailed swans-necked mares
begetting as they went,
plunged the entire Crusade
upon the Eastern Front
into chaotic bliss.
Angels from streets of gold
benignly looked on this,
God’s wonders to behold.
Both sides stood by unhorsed
while Nature ran its course.
GOING TO JERUSALEM. In: The Paris Review. Disponível em:< http://www.theparisreview.org/poetry/3291/going-to-jerusalem-maxine-kumin>. Acesso em: 08. Ago. 2016.
DEPOIS DO AMOR
Mais tarde, o compromisso.
Corpos reassumem seus limites.
Estas pernas, por exemplo, são minhas.
Teus braços levam-te de volta para dentro.
Iscas de nosso dedos, lábios
Aceitam seu domínio.
A roupa de cama boceja, uma porta
sopra vagamente entreaberta
e suspenso, um avião
cantarola descendo.
Nada mudou, exceto
havia um momento quando
o lobo, o famélico logo
que está fora de si mesmo
deita-se levemente, e adormece.
Tradução de Dalcin Lima aos 13 de dezembro de 2016.
AFTER LOVE
Afterward, the compromise.
Bodies resume their boundaries.
These legs, for instance, mine.
Your arms take you back in.
Spoons of our fingers, lips
admit their ownership.
The bedding yawns, a door
blows aimlessly ajar
and overhead, a plane
singsongs coming down.
Nothing is changed, except
there was a moment when
the wolf, the mongering wolf
who stands outside the self
lay lightly down, and slept.
AFTER LOVE. In: All Poetry. Disponível em:< https://allpoetry.com/column/11343162-Rest-in-Peace--Maxine-Kumin-by-WandaLeaBrayton>. Acesso em: 13. Dez. 2016.
HISTÓRICO BLACKSBURG, VIRGINIA
A tabuleta do banheiro ainda se lê
De Cor de um lado e Branco
de outro lado no velho
vagão que era usado para puxar
o emaranhado confuso de carros de frete cheios
de carvão da West Virginia.
Quem quer que entrasse tinha que sacudir
sua indicação do lado direito pra cima
apoiar então diante dos trilhos antes
de desabotoar as calças, de volta para a porta
e mijar no mesmo buraco sujo.
Tradução de Dalcin Lima aos 12 de dezembro de 2016.
HISTORIC BLACKSBURG, VIRGINIA
The lavatory sign still reads
Colored on one side and White
on the other in the old
caboose that used to trail
the raveled skein of freight cars full
of West Virginia coal.
Whoever entered had to flip
his designation right side up
then brace against the track before
unbuttoning, back to the door
and pissing down the same foul hole.
HISTORIC BLACKSBURG, VIRGINIA. In: Eleven Poems by Maxine Kumin - Persimmon Tree. Disponível em:<http://www.persimmontree.org/articles/Issue4/articles/MaxineKumin_ElevenPoems.pdf>. Acesso em: 12. Dez. 2016
JUNTOS
A água envolvendo
nos e o por
do sol é tudo.
Corrégos abrem caminho.
Convertemos numa
cidade de cascos partidos
e verdes dobrões.
Ó vós, piratas mortos
escutai-nos! Não há
salvamento. Tudo que
conheces é a cor
do quente caramelo. Tudo
é salgado. Veja como
nossos olhos migraram
para o lado alto da colina?
Agora somos novos
sussurros e nenhuma crista
deixa a água cobrir.
Acontece repetidas
vezes, eu em
teu corpo e tu
no meu corpo.
Tradução de Dalcin Lima aos 11 de dezembro de 2016.
TOGETHER
The water closing
over us and the
going down is all.
Gills are given.
We convert in a
town of broken hulls
and green doubloons.
O you dead pirates
hear us! There is
no salvage. All
you know is the color
of warm caramel. All
is salt. See how
our eyes have migrated
to the uphill side?
Now we are new round
mouths and no spines
letting the water cover.
It happens over
and over, me in
your body and you
in mine.
TOGETHER. In: Poetry Foundation. Disponível em: <https://www.poetryfoundation.org/poems-and-poets/poems/detail/43095>. Acesso em: 11. Dez. 2016
ESQUECIMENTO
A dúzia de maneiras que eles fazem isso –
de uma ponte, da traseira de um barco,
pílulas, cabeça no forno ou
embrulhada no velho caso mink da mãe,
na garagem, uma pisada no acelerador,
o motor do Cougar rangindo
enquanto ela atravessou.
O que eles deixaram para trás –
o esboço de um romance protelado, diários,
seus melhores poemas, o bilhete que termina em
agora você acreditará em mim
descendência de várias épocas, cônjuges
que se preocupavam e choram e ainda
admitem alívio agora que isso acabou.
Como eles inflamem, os velhos detalhes
Expostos à luz com um ícone de vidro colorido
a espingarda na boca, o barbante do dedo do pé ao gatilho; a língua
Uma ameixa azul forçada entre os lábios
Quando ele se enforcou nos aposentos dela –
(para nós isso nunca acaba)
que roubou a cena, cortou o nariz,
puxou a tomada da banheira na água rósea,
quebrou janelas, fechou o gás,
passeou de ambulância, apenas minutos após
de carregar o corpo rebentado de más notícias.
Estamos, cada um de nós, presos na armadilha deste enredo.
Deixado para trás, não há esquecimento.
Tradução de Dalcin Lima aos 07 de fevereiro de 2016.
OBLIVION
The dozen ways they did it -
off a bridge, the back of a boat,
pills, head in the oven, or
wrapped in her mother's old mink coat
in the garage, a brick on the accelerator,
the Cougar's motor thrumming
while she crossed over.
What they left behind -
the outline of a stalled novel, diaries,
their best poems, the note that ends
now will you believe me,
offspring of various ages, spouses
who cared and weep and yet
admit relief now that it's over.
How they fester, the old details
held to the light like a stained-glass icon
- the shotgun in the mouth, the string
from toe to trigger; the tongue
a blue plum forced between his lips
when he hanged himself in her closet -
for us it is never over
who raced to the scene, cut the noose,
pulled the bathtub plug on pink water,
broke windows, turned off the gas,
rode in the ambulance, only minutes later
to take the body blow of bad news.
We are trapped in the plot, every one.
Left behind, there is no oblivion.
OBLIVION. In: The Atlantic. Disponível em:
CONTINUUM: UM POEMA DE AMOR
indo para a videira com
a escada de mão e o balde na
primeira chuva cortante
de setembro chuva
embebendo o cisco
num alegre ruído o céu
levantando-se como vapor
de um tacho de uvas
a ferver selvagens uvas azedas
malvadamente altas envolvido num sumo
da teia de aranha e espuma de inseto
indo para videira ano
após ano nós dois com uma escada de mão e balde manchado
pela chuva de uvas
nossa secreta linguagem.
Tradução de Dalcin Lima aos 07 de fevereiro de 2016.
CONTINUUM: A LOVE POEM
going for grapes with
ladder and pail in
the first slashing rain
of September rain
steeping the dust
in a joyous squelch the sky
standing up like steam
from a kettle of grapes
at the boil wild fox grapes
wickedly high tangled in must
of cobweb and bug spit
going for grapes year
after year we two with
ladder and pail stained
with the rain of grapes
our private language
CONTINUUM: A LOVE POEM. In: The Atlantic. Disponível em: < https://www.theatlantic.com/past/docs/unbound/poetry/antholog/kumin/contin.htm Acesso em: 07. Fev. 2016.
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