A PIOR COISA
A um lado da autoestrada, as colinas áridas.
Do outro, na distância, restos das marés,
estuários, baía, a passagem estreita
do oceano. Não descreveria em
palavras, pois — a pior coisa,
mas pensei que eu pudesse dizer, eu diria
palavra por palavra. Meu amigo estava dirigindo,
ao nível do mar, pelas colinas costeiras, vales,
sopés, montanhas — o declive, para ambos,
de nossos primeiros anos. Teria dito
que dificilmente me importava agora, a dor,
que me importava — dizer que havia
um deus — de amor — e havia dado — quis dizer
dado — minha vida — para isso — e eu
fracassei, bem que pude apenas sofrer por isso —
mas o que se eu,
tivesse feito mal, amor? Eu gritei isso alto,
e em meus óculos a água salgada se acumulou, quase
suave para mim, mas logo, disseram,
a pior coisa — e uma vez mencionada,
soube que não havia deus de amor, havia somente
gente. E meu amigo chegou até,
onde meus punhos se apertaram
e com a costa de sua mão os esfregou, por um segundo,
desajeitamente, com cortesia
não a de eros, mas com uma amabilidade caseira.
Tradução de Dalcin Lima baseado na versão espanhola de Alain Pallais. In: Círculo de Poesía. Disponível em:< http://circulodepoesia.com/2015/06/poesia-norteamericana-sharon-olds-2/ >. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE WORST THING
One side of the highway, the waterless hills.
The other, in the distance, the tidal wastes,
estuaries, bay, throat
of the ocean. I had not put it into
words, yet—the worst thing,
but I thought that I could say it, if I said it
word by word. My friend was driving,
sea-level, coastal hills, valley,
foothills, mountains—the slope, for both,
of our earliest years. I had been saying
that it hardly mattered to me now, the pain,
what I minded was—say there was
a god—of love—and I’d given—I had meant
to give—my life—to it—and I
had failed, well I could just suffer for that—
but what, if I,
had harmed, love? I howled this out,
and on my glasses the salt water pooled, almost
sweet to me, then, because it was named,
the worst thing—and once it was named,
I knew there was no god of love, there were only
people. And my friend reached over,
to where my fists clutched each other,
and the back of his hand rubbed them, a second,
with clumsiness, with the courtesy
of no eros, the homemade kindness.
THE WORST THING. In: CÍRCULO DE POESÍA. Disponível em:< http://circulodepoesia.com/2015/06/poesia-norteamericana-sharon-olds-2/ >. Acesso em: 29. Jul. 2016.
A TRAÇÃO
A cada hora, ele está mudando,
Perdendo alguma velha capacidade.
Joelhos dobrados, corpo cor de cobre,
Cabelo grisalho, denso com
Gel como um ritual de unção, meu pai
Avança, hora após hora, com a cabeça erguida
Até a morte, sinto cada centímetro seu
Dentro de mim próximo dele, igual a cada filho
Que percorreu, lentamente, abaixo pelo meu corpo,
Como se eu fosse Deus sentindo os rios
Puxandoo-os calmamente por meu corpo, e a terra
Pressionando inteiramente, o universo
m si mesmo arrasta-se por mim simples e pesadamente,
Estendido por meu corpo como guardanapo num anel –
Como se meu pai pudesse viver e morrer.
Tradução de Dalcin Lima apoiado na versão espanhola de cción de Sandra Toro. In: El Placard. Disponível em:< http://el-placard.blogspot.com.br/2012/02/el-conocer-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE PULLING
Every hour, now, he is changing,
shedding some old ability.
Knees up, body tin-colored,
hair black and grey, thick with
grease like ritual unguent, my father
moves, hour by hour, head-first,
toward death, I sense every inch of him moving
through me toward it, the way each child
moved, slowly, down through my body,
as if I were God feeling the rivers
pulling steadily through me, and the earth
pressing through, the universe
itself hauled through me heavily and easily,
drawn through my body like a napkin through a ring –
as if my father could live and die.
THE PULLING. In: El Placard. Disponível em:< http://el-placard.blogspot.com.br/2012/02/el-conocer-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
A ÚLTIMA HORA
The other, in the distance, the tidal wastes,
estuaries, bay, throat
of the ocean. I had not put it into
words, yet—the worst thing,
but I thought that I could say it, if I said it
word by word. My friend was driving,
sea-level, coastal hills, valley,
foothills, mountains—the slope, for both,
of our earliest years. I had been saying
that it hardly mattered to me now, the pain,
what I minded was—say there was
a god—of love—and I’d given—I had meant
to give—my life—to it—and I
had failed, well I could just suffer for that—
but what, if I,
had harmed, love? I howled this out,
and on my glasses the salt water pooled, almost
sweet to me, then, because it was named,
the worst thing—and once it was named,
I knew there was no god of love, there were only
people. And my friend reached over,
to where my fists clutched each other,
and the back of his hand rubbed them, a second,
with clumsiness, with the courtesy
of no eros, the homemade kindness.
THE WORST THING. In: CÍRCULO DE POESÍA. Disponível em:< http://circulodepoesia.com/2015/06/poesia-norteamericana-sharon-olds-2/ >. Acesso em: 29. Jul. 2016.
A TRAÇÃO
A cada hora, ele está mudando,
Perdendo alguma velha capacidade.
Joelhos dobrados, corpo cor de cobre,
Cabelo grisalho, denso com
Gel como um ritual de unção, meu pai
Avança, hora após hora, com a cabeça erguida
Até a morte, sinto cada centímetro seu
Dentro de mim próximo dele, igual a cada filho
Que percorreu, lentamente, abaixo pelo meu corpo,
Como se eu fosse Deus sentindo os rios
Puxandoo-os calmamente por meu corpo, e a terra
Pressionando inteiramente, o universo
m si mesmo arrasta-se por mim simples e pesadamente,
Estendido por meu corpo como guardanapo num anel –
Como se meu pai pudesse viver e morrer.
Tradução de Dalcin Lima apoiado na versão espanhola de cción de Sandra Toro. In: El Placard. Disponível em:< http://el-placard.blogspot.com.br/2012/02/el-conocer-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE PULLING
Every hour, now, he is changing,
shedding some old ability.
Knees up, body tin-colored,
hair black and grey, thick with
grease like ritual unguent, my father
moves, hour by hour, head-first,
toward death, I sense every inch of him moving
through me toward it, the way each child
moved, slowly, down through my body,
as if I were God feeling the rivers
pulling steadily through me, and the earth
pressing through, the universe
itself hauled through me heavily and easily,
drawn through my body like a napkin through a ring –
as if my father could live and die.
THE PULLING. In: El Placard. Disponível em:< http://el-placard.blogspot.com.br/2012/02/el-conocer-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
A ÚLTIMA HORA
Inesperadamente, a últim hora
antes de me levar ao aeroporto, ele ficou de pé,
chocando-se contra la mesa, deu um passo
em minha direção como um personagem de um antigo
Filme de ficção científica inclinou-se
e baixou-se, abrindo um abraço,
tocando meu peito, e tentou dar-me
um abraço, fiquei de pé e tropeçamos,
e então ficamos, a volta do nosso núcleo,
seu áspero pranto de temor, ao centro,
ao final, de nossas vidas. Então, rapidamente,
o pior tinha acabado, pude consolá-lo,
por trás segurei seu coração
e o acariciei de frente, sua própria
vida prosseguindo, e o que
a segurava, junto do seu coração — e que o ligava
a mim – agora repousa e nos rodeia,
água-marinha, ferrugem, luz, fragmentos,
os eternos cachinhos de Eros
finalmente vencendo-nos.
Tradução de Dalcin Lima apoiado na versão espanhola de Alain Pallais. In: Círculo de Poesía. Disponível em:< http://circulodepoesia.com/2015/06/poesia-norteamericana-sharon-olds-2/>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE LAST HOUR
Suddenly, the last hour
before he took me to the airport, he stood up,
bumping the table, and took a step
toward me, and like a figure in an early
science fiction movie he leaned
forward and down, and opened an arm,
knocking my breast, and he tried o take some
hold of me, I stood and we stumbled,
and then we stood, around our core, his
hoarse cry of awe, at the centre,
at the end of, of our life. Quickly, then,
the worst was over, I could comfort him,
holding his heart in place from the back
and smoothing it from the front, his own
life continuing, and what had
bound him, around his heart – and bound him
to me – now lying on and around us,
sea-water, rust, light , shards,
the little eternal curls of eros
beaten out straight.
THE LAST HOUR. In: Kamini Banga. Disponível em:< http://www.kaminibanga.com/musings/poetry/poems/279-the-last-hour.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
A CORRIDA
Assim que cheguei ao aeroporto precipitei-me para o balcão,
comprei o bilhete, dez minutos depois
anunciaram-me que o voo tinha sido cancelado, os médicos
tinham-me dito que o meu pai não passaria desta noite
e o voo tinha sido cancelado. Um homem jovem
de bigode castanho escuro disse-me
que uma outra companhia tinha um voo
directo dali a sete minutos. Está a ver
aquele elevador, bem desça
até ao primeiro piso, vire à direita e
encontrará um autocarro amarelo, saia no
segundo terminal da Pan Am, e eu
corri, eu que não tenho qualquer sentido de orientação
lancei-me na direcção exacta que ele me indicou, um peixe
deslocando-se destramente corrente acima
contra o movimento do rio. Saltei do tal autocarro com as tais
mochilas para onde tinha atirado tudo
em cinco minutos, e corri, as mochilas
balançando-me de um lado para o outro como que
para provar que eu estava sujeita às leis da matéria,
corri em direcção ao homem com uma flor branca ao peito,
eu que vou sempre até aos limites, eu disse
Ajude-me. Ele olhou para o bilhete e disse
Vire à esquerda e depois à direita, suba pelas escadas rolantes e depois
corra. Arrastei-me pelas escadas rolantes e,
lá em cima, vi o corredor,
depois inspirei fundo, e disse
Adeus ao meu corpo, adeus ao conforto,
usei as minhas pernas e o meu coração como se
os tivesse alegremente só para isto,
para o tocar uma vez mais nesta vida. Corri e
as mochilas embatiam em mim, rodando e virando-se
em órbitas oblíquas, eu que tenho visto imagens de
mulheres a correr com os seus haveres presos
a tiracolo agarrados nas mãos fechadas, eu abençoei
as longas pernas que ele me deu, o meu forte
coração que eu abandonei ao seu próprio desígnio,
eu corri para a Porta 17 e estavam quase
a levantar o compacto losango
branco da porta para o acomodar
no encaixe do avião. Como aquele que
não é excessivamente rico, virei-me de lado e
esgueirei-me pelo buraco da agulha, e depois
desci pela coxia até ao meu pai. O avião
estava lotado e o cabelo das pessoas brilhava, elas
sorriam no interior do aparelho cheio de uma
névoa de luz dourada e analgésica,
eu chorei como se chora quando se chega ao céu,
num pesado alívio. Levantámo-nos
suavemente numa das pontas do continente
e não parámos se não quando aterrámos levemente
na outra extremidade. Eu entrei no quarto dele
e vi-lhe o peito a subir devagar
e a fundar-se de novo, vi-o
toda a noite a respirar.
Tradução de LP. In: Do Trapézio, sem rede – poesia passada para o português. Disponível em:< http://arspoetica-lp.blogspot.com.br/2009/10/sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE RACE
When I got to the airport I rushed up to the desk,
bought a ticket, ten minutes later
they told me the flight was cancelled, the doctors
had said my father would not live through the night
and the flight was cancelled. A young man
with a dark brown moustache told me
another airline had a nonstop
leaving in seven minutes. See that
elevator over there, well go
down to the first floor, make a right, you'll
see a yellow bus, get off at the
second Pan Am terminal, I
ran, I who have no sense of direction
raced exactly where he'd told me, a fish
slipping upstream deftly against
the flow of the river. I jumped off that bus with those
bags I had thrown everything into
in five minutes, and ran, the bags
wagged me from side to side as if
to prove I was under the claims of the material,
I ran up to a man with a flower on his breast,
I who always go to the end of the line, I said
Help me. He looked at my ticket, he said
Make a left and then a right, go up the moving stairs and then
run. I lumbered up the moving stairs,
at the top I saw the corridor,
and then I took a deep breath, I said
goodbye to my body, goodbye to comfort,
I used my legs and heart as if I would
gladly use them up for this,
to touch him again in this life. I ran, and the
bags banged against me, wheeled and coursed
in skewed orbits, I have seen pictures of
women running, their belongings tied
in scarves grasped in their fists, I blessed my
long legs he gave me, my strong
heart I abandoned to its own purpose,
I ran to Gate 17 and they were
just lifting the thick white
lozenge of the door to fit it into
the socket of the plane. Like the one who is not
too rich, I turned sideways and
slipped through the needle's eye, and then
I walked down the aisle toward my father. The jet
was full, and people's hair was shining, they were
smiling, the interior of the plane was filled with a
mist of gold endorphin light,
I wept as people weep when they enter heaven,
in massive relief. We lifted up
gently from one tip of the continent
and did not stop until we set down lightly on the
other edge, I walked into his room
and watched his chest rise slowly
and sink again, all night
I watched him breathe.
THE RACE. In: The Best American Poetry. Disponível em:< http://thebestamericanpoetry.typepad.com/the_best_american_poetry/the-race-by-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
PRIMITIVOS
Ouvi falar da gente civilizada,
os matrimónios temperados por conversas, elegantes e
honestos, racionais. Mas tu e eu somos
selvagens. Tu chegas com um saco,
entregas-mo em silêncio.
Sei logo que é Porco Moo Shu pelo cheiro
e percebo a mensagem: dei-te imenso
prazer ontem à noite. Sentamo-nos
tranquilamente, lado a lado, para comer,
os crepes compridos suspensos a entornar,
o molho fragrante a escorrer,
e de esguelha olhamos um para o outro, sem palavras,
os cantos dos olhos limpos como pontas de lança
pousadas no parapeito para mostrar
que aqui um amigo se senta com um amigo.
Tradução de Margarida Vale de Gato. In: PALIAVANA. Disponível em:< http://paliavana.blogspot.com.br/2005/08/satans-diz-sharon-olds-linguagem-da.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
PRIMITIVE
I have heard about the civilized,
the marriages run on talk, elegant and honest, rational. But you and I are
savages. You come in with a bag,
hold it out to me in silence.
I know Moo Shu Pork when I smell it
and understand the message: I have
pleased you greatly last night. We sit
quietly, side by side, to eat,
the long pancakes dangling and spilling,
fragrant sauce dripping out,
and glance at each other askance, wordless,
the corners of our eyes clear as spear points
laid along the sill to show
a friend sits with a friend here.
PRIMITIVE. In: The Best Poems. Disponível em:< http://www.best-poems.net/sharon_olds/primitive.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
AS FORMAS
Sempre tive a sensação que minha mãe
morreria por nós, se jogaria no fogo
para nos tirar dalí, seu cabelo queimando como
um halo, saltar n’água, seu corpo
branco descendo e girando lentamente,
o astronauta cujo cabo é cortado e
cai
no
vazio. Ela nos
cobriria com seu corpo, colocaria seus
seios entre nossos corpos e a faca,
nos colocaria no bolso de seu casaco
longe dos temporais. Na tragédia, um animal
fêmea, morreria por nós,
antes de me levar ao aeroporto, ele ficou de pé,
chocando-se contra la mesa, deu um passo
em minha direção como um personagem de um antigo
Filme de ficção científica inclinou-se
e baixou-se, abrindo um abraço,
tocando meu peito, e tentou dar-me
um abraço, fiquei de pé e tropeçamos,
e então ficamos, a volta do nosso núcleo,
seu áspero pranto de temor, ao centro,
ao final, de nossas vidas. Então, rapidamente,
o pior tinha acabado, pude consolá-lo,
por trás segurei seu coração
e o acariciei de frente, sua própria
vida prosseguindo, e o que
a segurava, junto do seu coração — e que o ligava
a mim – agora repousa e nos rodeia,
água-marinha, ferrugem, luz, fragmentos,
os eternos cachinhos de Eros
finalmente vencendo-nos.
Tradução de Dalcin Lima apoiado na versão espanhola de Alain Pallais. In: Círculo de Poesía. Disponível em:< http://circulodepoesia.com/2015/06/poesia-norteamericana-sharon-olds-2/>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE LAST HOUR
Suddenly, the last hour
before he took me to the airport, he stood up,
bumping the table, and took a step
toward me, and like a figure in an early
science fiction movie he leaned
forward and down, and opened an arm,
knocking my breast, and he tried o take some
hold of me, I stood and we stumbled,
and then we stood, around our core, his
hoarse cry of awe, at the centre,
at the end of, of our life. Quickly, then,
the worst was over, I could comfort him,
holding his heart in place from the back
and smoothing it from the front, his own
life continuing, and what had
bound him, around his heart – and bound him
to me – now lying on and around us,
sea-water, rust, light , shards,
the little eternal curls of eros
beaten out straight.
THE LAST HOUR. In: Kamini Banga. Disponível em:< http://www.kaminibanga.com/musings/poetry/poems/279-the-last-hour.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
A CORRIDA
Assim que cheguei ao aeroporto precipitei-me para o balcão,
comprei o bilhete, dez minutos depois
anunciaram-me que o voo tinha sido cancelado, os médicos
tinham-me dito que o meu pai não passaria desta noite
e o voo tinha sido cancelado. Um homem jovem
de bigode castanho escuro disse-me
que uma outra companhia tinha um voo
directo dali a sete minutos. Está a ver
aquele elevador, bem desça
até ao primeiro piso, vire à direita e
encontrará um autocarro amarelo, saia no
segundo terminal da Pan Am, e eu
corri, eu que não tenho qualquer sentido de orientação
lancei-me na direcção exacta que ele me indicou, um peixe
deslocando-se destramente corrente acima
contra o movimento do rio. Saltei do tal autocarro com as tais
mochilas para onde tinha atirado tudo
em cinco minutos, e corri, as mochilas
balançando-me de um lado para o outro como que
para provar que eu estava sujeita às leis da matéria,
corri em direcção ao homem com uma flor branca ao peito,
eu que vou sempre até aos limites, eu disse
Ajude-me. Ele olhou para o bilhete e disse
Vire à esquerda e depois à direita, suba pelas escadas rolantes e depois
corra. Arrastei-me pelas escadas rolantes e,
lá em cima, vi o corredor,
depois inspirei fundo, e disse
Adeus ao meu corpo, adeus ao conforto,
usei as minhas pernas e o meu coração como se
os tivesse alegremente só para isto,
para o tocar uma vez mais nesta vida. Corri e
as mochilas embatiam em mim, rodando e virando-se
em órbitas oblíquas, eu que tenho visto imagens de
mulheres a correr com os seus haveres presos
a tiracolo agarrados nas mãos fechadas, eu abençoei
as longas pernas que ele me deu, o meu forte
coração que eu abandonei ao seu próprio desígnio,
eu corri para a Porta 17 e estavam quase
a levantar o compacto losango
branco da porta para o acomodar
no encaixe do avião. Como aquele que
não é excessivamente rico, virei-me de lado e
esgueirei-me pelo buraco da agulha, e depois
desci pela coxia até ao meu pai. O avião
estava lotado e o cabelo das pessoas brilhava, elas
sorriam no interior do aparelho cheio de uma
névoa de luz dourada e analgésica,
eu chorei como se chora quando se chega ao céu,
num pesado alívio. Levantámo-nos
suavemente numa das pontas do continente
e não parámos se não quando aterrámos levemente
na outra extremidade. Eu entrei no quarto dele
e vi-lhe o peito a subir devagar
e a fundar-se de novo, vi-o
toda a noite a respirar.
Tradução de LP. In: Do Trapézio, sem rede – poesia passada para o português. Disponível em:< http://arspoetica-lp.blogspot.com.br/2009/10/sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE RACE
When I got to the airport I rushed up to the desk,
bought a ticket, ten minutes later
they told me the flight was cancelled, the doctors
had said my father would not live through the night
and the flight was cancelled. A young man
with a dark brown moustache told me
another airline had a nonstop
leaving in seven minutes. See that
elevator over there, well go
down to the first floor, make a right, you'll
see a yellow bus, get off at the
second Pan Am terminal, I
ran, I who have no sense of direction
raced exactly where he'd told me, a fish
slipping upstream deftly against
the flow of the river. I jumped off that bus with those
bags I had thrown everything into
in five minutes, and ran, the bags
wagged me from side to side as if
to prove I was under the claims of the material,
I ran up to a man with a flower on his breast,
I who always go to the end of the line, I said
Help me. He looked at my ticket, he said
Make a left and then a right, go up the moving stairs and then
run. I lumbered up the moving stairs,
at the top I saw the corridor,
and then I took a deep breath, I said
goodbye to my body, goodbye to comfort,
I used my legs and heart as if I would
gladly use them up for this,
to touch him again in this life. I ran, and the
bags banged against me, wheeled and coursed
in skewed orbits, I have seen pictures of
women running, their belongings tied
in scarves grasped in their fists, I blessed my
long legs he gave me, my strong
heart I abandoned to its own purpose,
I ran to Gate 17 and they were
just lifting the thick white
lozenge of the door to fit it into
the socket of the plane. Like the one who is not
too rich, I turned sideways and
slipped through the needle's eye, and then
I walked down the aisle toward my father. The jet
was full, and people's hair was shining, they were
smiling, the interior of the plane was filled with a
mist of gold endorphin light,
I wept as people weep when they enter heaven,
in massive relief. We lifted up
gently from one tip of the continent
and did not stop until we set down lightly on the
other edge, I walked into his room
and watched his chest rise slowly
and sink again, all night
I watched him breathe.
THE RACE. In: The Best American Poetry. Disponível em:< http://thebestamericanpoetry.typepad.com/the_best_american_poetry/the-race-by-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
PRIMITIVOS
Ouvi falar da gente civilizada,
os matrimónios temperados por conversas, elegantes e
honestos, racionais. Mas tu e eu somos
selvagens. Tu chegas com um saco,
entregas-mo em silêncio.
Sei logo que é Porco Moo Shu pelo cheiro
e percebo a mensagem: dei-te imenso
prazer ontem à noite. Sentamo-nos
tranquilamente, lado a lado, para comer,
os crepes compridos suspensos a entornar,
o molho fragrante a escorrer,
e de esguelha olhamos um para o outro, sem palavras,
os cantos dos olhos limpos como pontas de lança
pousadas no parapeito para mostrar
que aqui um amigo se senta com um amigo.
Tradução de Margarida Vale de Gato. In: PALIAVANA. Disponível em:< http://paliavana.blogspot.com.br/2005/08/satans-diz-sharon-olds-linguagem-da.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
PRIMITIVE
I have heard about the civilized,
the marriages run on talk, elegant and honest, rational. But you and I are
savages. You come in with a bag,
hold it out to me in silence.
I know Moo Shu Pork when I smell it
and understand the message: I have
pleased you greatly last night. We sit
quietly, side by side, to eat,
the long pancakes dangling and spilling,
fragrant sauce dripping out,
and glance at each other askance, wordless,
the corners of our eyes clear as spear points
laid along the sill to show
a friend sits with a friend here.
PRIMITIVE. In: The Best Poems. Disponível em:< http://www.best-poems.net/sharon_olds/primitive.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
AS FORMAS
Sempre tive a sensação que minha mãe
morreria por nós, se jogaria no fogo
para nos tirar dalí, seu cabelo queimando como
um halo, saltar n’água, seu corpo
branco descendo e girando lentamente,
o astronauta cujo cabo é cortado e
cai
no
vazio. Ela nos
cobriria com seu corpo, colocaria seus
seios entre nossos corpos e a faca,
nos colocaria no bolso de seu casaco
longe dos temporais. Na tragédia, um animal
fêmea, morreria por nós,
mas na vida tal como era
ela teria que se colocar ela mesma
em primeiro lugar.
Ela teria que fazer o que quer que
fosse mandado fazer por seus filhos, ela tinha
que proteger-se. Na guerra, teria
morreria por nós, te garanto que ela morreria,
e eu sei: sou uma estudiosa da guerra,
dos fornos de gás, de asfixia, de facas,
dos afogamentos, queimaduras, todas as formas
nas quais eu experimentei de seu amor.
Tradução de Dalcin Lima bseada na versão de Juan José Almagro Iglesias e Carlos Jiménez Arribas. In: Frases para Wasap. Disponível em:< http://frasesparawasap.blogspot.com.br/2004/12/poem-sharon-olds-forms-poemas-en-ingles.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
THE FORMS
I always had the feeling my mother would
die for us, jump into a fire
to pull us out, her hair burning like
a halo, jump into water, her white
body going down and turning slowly,
the astronaut whose hose is cut
falling
into
blackness. She would have
covered us with her body, thrust her
breasts between our chests and the knife,
slipped us into her coat pocket
outside the showers. In disaster, an animal
mother, she would have died for us,
but in life as it was
she had to put herself
first.
She had to do whatever he
told her to do to the children, she had to
protect herself. In war, she would have
died for us, I tell you she would,
and I know: I am a student of war,
of gas ovens, smothering, knives,
drowning, burning, all the forms
in which I have experienced her love.
THE FORMS. Homework Assistance. Disponível em:< http://www.emule.com/2poetry/phorum/read.php?6,147531>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
ÚLTIMO POEMA PARA MEU PAI
De repente pensei em ti
como uma criança naquela casa, quartos escuros
e a cálida lareira com o homem em frente,
calado. Te movimentavas pelo ar pesado
com tua beleza corporal, um menino de sete anos,
desamparado, esperto, havia coisas que o homem
fez próximo a ti, e era teu pai,
o molde com o qual foste criado. Abaixo no
celeiro, barris de doces maçãs,
colhidas nos ramos da árvore, apodrecidas e
decompostas, e além da porta do celeiro
o arroio corria e corria, e algo não
te foi dado, ou algo foi
tirado de ti, algo com o que nasceste, assim é que
mesmo aos 30 e 40 colocas
um medicamento oleoso em teus lábios
a cada noite, o veneno que te ajuda
a cair inconsciente. Sempre pensei
a maneira que nos fizeste
de adultos, mas logo lembrei que
aquela criança sendo moldada em frente ao fogo, os
ossinhos em sua alma
retorcidos em fraturas parciais, os pequenos
tendões que seguram o coração no local
trincado. E o que eles te fizeram
tu não me fizeste a mim. Agora quando te amo,
gosto de pensar que estou dando meu amor
diretamente para aquele garoto no quarto ardente,
como se esse amor pudesse alcançá-lo a tempo.
Tradução de Dalcin Lima baseado na versão espanhola de Emilia Alarcón. In: Zumo de Poesía. Disponível em:< http://zumo-de-poesia.blogspot.com.br/2013/12/poema-al-padre-por-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
LATE POEM TO MY FATHER
Suddenly I thought of you
as a child in that house, the unlit rooms
and the hot fireplace with the man in front of it,
silent. You moved through the heavy air
in your physical beauty, a boy of seven,
helpless, smart, there were things the man
did near you, and he was your father,
the mold by which you were made. Down in the
cellar, the barrels of sweet apples,
picked at their peak from the tree, rotted and
rotted, and past the cellar door
the creek ran and ran, and something was
not given to you, or something was
taken from you that you were born with, so that
even at 30 and 40 you set the
oily medicine to your lips
every night, the poison to help you
drop down unconscious. I always thought the
point was what you did to us
as a grown man, but then I remembered that
child being formed in front of the fire, the
tiny bones inside his soul
twisted in greenstick fractures, the small
tendons that hold the heart in place
snapped. And what they did to you
you did not do to me. When I love you now,
I like to think I am giving my love
Directly to that boy in the fiery room,
As if it could reach him in time.
LATE POEM TO MY FATHER. In: The Writer’s Almanac. Disponível em:< http://writersalmanac.publicradio.org/index.php?date=2005/11/17>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
como uma criança naquela casa, quartos escuros
e a cálida lareira com o homem em frente,
calado. Te movimentavas pelo ar pesado
com tua beleza corporal, um menino de sete anos,
desamparado, esperto, havia coisas que o homem
fez próximo a ti, e era teu pai,
o molde com o qual foste criado. Abaixo no
celeiro, barris de doces maçãs,
colhidas nos ramos da árvore, apodrecidas e
decompostas, e além da porta do celeiro
o arroio corria e corria, e algo não
te foi dado, ou algo foi
tirado de ti, algo com o que nasceste, assim é que
mesmo aos 30 e 40 colocas
um medicamento oleoso em teus lábios
a cada noite, o veneno que te ajuda
a cair inconsciente. Sempre pensei
a maneira que nos fizeste
de adultos, mas logo lembrei que
aquela criança sendo moldada em frente ao fogo, os
ossinhos em sua alma
retorcidos em fraturas parciais, os pequenos
tendões que seguram o coração no local
trincado. E o que eles te fizeram
tu não me fizeste a mim. Agora quando te amo,
gosto de pensar que estou dando meu amor
diretamente para aquele garoto no quarto ardente,
como se esse amor pudesse alcançá-lo a tempo.
Tradução de Dalcin Lima baseado na versão espanhola de Emilia Alarcón. In: Zumo de Poesía. Disponível em:< http://zumo-de-poesia.blogspot.com.br/2013/12/poema-al-padre-por-sharon-olds.html>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
LATE POEM TO MY FATHER
Suddenly I thought of you
as a child in that house, the unlit rooms
and the hot fireplace with the man in front of it,
silent. You moved through the heavy air
in your physical beauty, a boy of seven,
helpless, smart, there were things the man
did near you, and he was your father,
the mold by which you were made. Down in the
cellar, the barrels of sweet apples,
picked at their peak from the tree, rotted and
rotted, and past the cellar door
the creek ran and ran, and something was
not given to you, or something was
taken from you that you were born with, so that
even at 30 and 40 you set the
oily medicine to your lips
every night, the poison to help you
drop down unconscious. I always thought the
point was what you did to us
as a grown man, but then I remembered that
child being formed in front of the fire, the
tiny bones inside his soul
twisted in greenstick fractures, the small
tendons that hold the heart in place
snapped. And what they did to you
you did not do to me. When I love you now,
I like to think I am giving my love
Directly to that boy in the fiery room,
As if it could reach him in time.
LATE POEM TO MY FATHER. In: The Writer’s Almanac. Disponível em:< http://writersalmanac.publicradio.org/index.php?date=2005/11/17>. Acesso em: 29. Jul. 2016.
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